Chico Vartulli – O que significa ser cônsul honorário?
Sérgio Chamone – O Cônsul honorário representa um país estrangeiro em seu país de residência. Ele ou ela não necessitam ser originários daquele país, nem ter a nacionalidade do país no qual residem, ou seja, no caso da Finlândia, o(a) Cônsul Honorário(a) pode ser brasileiro(a), finlandês(a) ou de outra nacionalidade. Antes de mais nada deve ser uma pessoa de reputação ilibada, conhecida e respeitada em sua jurisdição consular, deve ter amplas conexões com o país que representa, seu ecossistema empresarial e necessariamente deve ter acesso às autoridades civis e militares locais, bem como às associações de classe, grandes empresas estatais e privadas, meio acadêmico e de pesquisa entre outros.
Ademais, deve-se fazer presente nos eventos consulares, importantes para a construção da paz internacional, do diálogo e, também, do intercâmbio de informações e contatos.
O Cônsul Honorário normalmente não é remunerado pelo país que representa, mas deve contar com estrutura necessária para levar a cabo suas funções. No meu caso em particular não sou remunerado, mas tenho um escritório na “Casa Europa”, onde também estão localizados os Consulados Gerais da França e da Alemanha, bem como uma Coordenadora Consular de nacionalidade finlandesa, a Taru Juurikko. Toda minha estrutura é paga pela Embaixada da Finlândia.
Eu, como Cônsul Geral Honorário, bem como, a minha Coordenadora Consular temos a responsabilidade de dar apoio aos cidadãos finlandeses em diversas situações, tanto de emergência como serviços consulares de rotina como registros em geral, apoio em óbitos, casos policiais, organização da votação local nas eleições finlandesas, entre outros. Não emitimos passaportes ou vistos. Contudo uma das principais atividades do Consulado é a organização das visitas oficiais do Embaixador ou da Embaixadora nos Estados da minha jurisdição, o Rio de Janeiro e Espírito Santo, assim como visitas de delegações de governo finlandês e empresariais a estes Estados. Também promovemos a cultura finlandesa, intercâmbio cultural entre Brasil e Finlândia, assim como, realizamos anualmente a Festa do Dia Nacional da Finlândia, sempre patrocinada por empresas líderes da Finlândia.
De um modo geral me ocupo das atividades estratégicas e a Coordenadora Consular com as atividades do dia a dia e apoio aos cidadãos finlandeses e de comunicação. De qualquer forma tenho conhecimento de todos os casos envolvendo cidadãos finlandeses e conto sempre com o importante apoio da Coordenadora Consular na organização de visitas oficiais e delegações aos Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo.
Chico Vartulli – Como tem aprimorado as relações comerciais com a Finlândia?
Sérgio Chamone – Tenho aprimorado as relações comerciais com o apoio da Embaixada, do Business Finland, organização governamental finlandesa de apoio e fomento às exportações, da FinnCham, a Câmara de Comércio Brasil-Finlândia, que tenho a honra de presidir e da minha equipe tanto no consulado como na FinnCham.
O aprimoramento das relações comerciais é baseado na complementariedade entre Brasil e Finlândia. Assim sendo, divulgamos as competências das empresas finlandesas que são úteis ao Brasil. Isso é feito através de visitas oficiais, de delegações empresariais ou de governo à empresas e governos, participação em congressos, eventos e feiras.
As empresas finlandesas se destacam no Brasil em diversas áreas como telecomunicações, celulose, energia, motores elétricos, a diesel, etanol e outras fontes renováveis para propulsão naval militar e civil, combustíveis renováveis, sustentabilidade, engenharia, meteorologia, mineração, software, segurança de dados, monitoramento satelital para Amazônia verde e para a azul entre outras.
Chico Vartulli – Os brasileiros representam um fluxo importante para o turismo finlandês ?
Sérgio Chamone – Não muito, mas os brasileiros têm descoberto a beleza da Finlândia, na Lapônia, a terra do Papai Noel, cross country ski, safaris com trenós puxados por renas ou cachorros, com céu azul, sol e muita neve. Também, curtem a arquitetura da linda capital Helsinki como outras cidades famosas do país como Turku, Tampere, Porvoo, Rovaniemi, Lappeenranta e também na Finlândia brasileira: em Penedo, RJ. Se Papai Noel tem uma casa em Rovaniemi não podemos esquecer que também tem uma casa tropical na “Pequena Finlândia” em Penedo, RJ…
Chico Vartulli – A Finlândia tem recebido muitos imigrantes e exilados ?
Sérgio Chamone – Sim! A Finlândia tem sido um país bem acolhedor. É fato que sua população está envelhecendo e a imigração qualificada é estimulada. O Brasil é um dos países foco do programa “Talent Boost” que estimula a imigração de brasileiros com determinadas competências para a Finlândia. Adicionalmente a Finlândia, historicamente recebeu ao longo das ultimas décadas refugiados de zonas de guerra. De fato, fico feliz de ver o alto nível de integração destas pessoas depois de mais de uma geração na Finlândia. O sistema inclusivo da Finlândia faz com que os filhos de imigrantes estudem nas mesmas escolas dos cidadãos natos e tenham chances iguais de vencer na vida. Vejo inclusive, sem amostra estatística, que os imigrantes já compartilham valores finlandeses como a importância e o “prazer” de pagar impostos tendo em vista o retorno que tem em serviços prestados ao cidadão pelo estado, como educação, saúde, medicina e infraestruturas em geral.
Chico Vartulli – É a primeira vez que um cônsul honorário é vice decano. Que funções vai desempenhar?
Sérgio Chamone – Meu principal objetivo, tanto como Cônsul Geral Honorário e Vice-Decano do Corpo Consular é servir.
O que estiver ao meu alcance para contribuir às pautas do corpo consular, o farei sob a liderança do nosso Decano Anjoum Noorani. Sem dúvida, o fato de ser brasileiro e viver há décadas no Rio de Janeiro me ajudou a formar um grande networking de pessoas em funções chave e por conseguinte contribuir a fazer conexões sempre que necessário no exercício desta função.
Valorizo muito a união dos membros do corpo consular. Temos várias pautas importantes para o desempenho de nossas funções consulares. Com efeito, é importante nos fazermos representar para negociá-las com os decisores tanto nos diferentes níveis de governo como em alguns casos junto à iniciativa privada.

Chico Vartulli – Ser chef é um de seus passatempos favoritos. Pode nos contar um pouco mais sobre as experiências gastronômicas…
Sérgio Chamone – Tenho muitas experiências gastronômicas! Recentemente tive o prazer de participar junto com a Embaixadora Johanna Karanko na abertura do Festival Gastronômico Finlandês na renomada escola culinária internacional o “Cordon Bleu” em Botafogo. Eu participei da confecção da levíssima sobremesa com frutas vermelhas; já a Embaixadora participou do sofisticado Prato Principal com Truta defumada, ambos sob a liderança super didática do Chef Fino-Venezuelano Pedro Rodriguez. Foi um enorme sucesso…
Pessoalmente adoro preparar vários dos pratos servidos na festa do Dia Nacional da Finlândia como o Gravlax, salmão marinado com sal grosso, açúcar e dill, e o pão finlandês feito com vários cereais, um deles encontrado apenas na Finlândia, o “centeio maltado”. Para quem não sabe o malte é um processo, ou seja, centeio maltado é o centeio que começa a germinar e é secado de forma rápida. Este centeio maltado é perfumado e ajuda a fermentar, não só o pão como também para a produção de uma cerveja caseira, conhecida na Finlândia como “Kotikalja”. Na Europa medieval variações dessa cerveja eram muito comuns, a “small beer” devido ao baixo teor alcóolico de menos de 2% e portanto substituía com segurança a água… O interessante com o centeio maltado é que se pode fazer cerveja, e com o resíduo do processo pode-se fazer um pão maltado e com o pão velho maltado fazer cerveja…
Adicionalmente adoro a cozinha fusion. Mesclo técnicas e ingredientes franceses, finlandeses, brasileiros e orientais fazendo novas criações. É fascinante, gostoso e bom para a saúde pois escolho aquilo que é saudável e não engorda em minhas receitas.
Chico Vartulli – Como é tratada a igualdade de gênero na diplomacia finlandesa?
Sérgio Chamone – A Finlândia é líder global em igualdade de gêneros.
Na sociedade finlandesa isto é bastante natural pois as mulheres sempre tiveram um papel relevante na sociedade. Atualmente praticamente metade das cadeiras do parlamento são ocupadas por mulheres e 30% das empresas listadas em bolsa têm CEOs mulheres. No que tange a distribuição de Embaixadores(as) Finlandeses(as) no mundo, 50% das posições é exercida por mulheres. No Brasil, por exemplo, a Embaixada da Finlândia atualmente é encabeçada pela S.E. Embaixadora Johanna Karanko.
É importante ressaltar que a igualdade na Finlândia não é baseada em cotas mas em meritocracia!
Com efeito, a Embaixadora Karanko não se diferencia por ser mulher, mas por sua liderança, exercida com muita competência, energia e simpatia.
Por sua vez, a nível dos consulados honorários da Finlândia no Brasil algumas mulheres já exerceram a função, dentre elas destaco a Diana Baroness Lewe van Aduard de Macedo-Soares, que me antecedeu na posição de Consul Geral Honorário no RJ/ES. Diana foi reconhecida por todos seus superiores, pares e colegas como uma excelente Consul Geral Honorária. De fato, a considero como minha mentora. Durante todos os seus 15 anos, a frente do Consulado, a apoiei em sua missão e muito aprendi com ela no que tange as responsabilidades, deveres e a liturgia do cargo.
Atualmente, apenas 2 dos 8 cônsules honorários da Finlândia no Brasil são mulheres, mas gradualmente esta proporção está sendo alterada, visando a um equilíbrio de gêneros.
Por fim, queria destacar a Heidi Virta que é a Diretora do Business Finland para América Latina, agência governamental finlandesa equivalente a APEX, com sede em São Paulo.
A Heidi Virta, que é um outro exemplo de meritocracia e liderança feminina, acabou de lançar um brilhante livro sobre a felicidade com referências filosóficas. O nome do livro é: “Happiness Rules: Timeless wisdom guidelines for a happier life”.
Recomendo muito a leitura a todos!
Chico Vartulli – Uma frase favorita do cônsul.
Sérgio Chamone – “Nada é tão bonito quanto construir algo. Nada é tão difícil quanto manter.” Diógenes.

Fotos: Divulgação /Arquivo pessoal