Em foco – Olá padre Juarez! Onde você nasceu? Sua família? Infância e adolescência? Formação fundamental e média?
Padre Juarez de Castro – Eu nasci em Lavras, cidade do sul de Minas Gerais. Minha família é crista, católica, mas não tão católica, como se fossemos tão mais católicos do que os outros, mas uma família normal do interior de Minas Gerais, que tinha o costume de ir a missa, participar da vida da Igreja, mas nada além do normal. Eu não era mais cristão do que os outros. Nunca participei de grupos jovens, nem coroinha. Eu poderia me classificar como um cristão medíocre, mediano. Estudava num colégio de padres, Nossa Senhora de Aparecida. E essa era a minha ligação com a Igreja. Tive uma infância normal. Uma adolescência também normal. Na minha infância e adolescência, eu nunca pensei em ser padre. Eu queria ser médico. Tentei o vestibular. Fui aprovado. Mas não fui fazer o curso. Foi quando eu decidi ir para o seminário, e fui. Minha formação é aquela ordinária de todo padre: são dez anos de estudos, sendo dois anos de estudos propedêuticos, um ano de noviciado, três anos de Filosofia, e quatro anos de Teologia, quando concluímos Teologia e somos ordenados padre.
Em foco – Quando você começou a se interessar pelos estudos teológicos?
Padre Juarez de Castro – Até aos dezoito anos de idade, eu nunca tinha pensado em ser padre. Porque eu não tinha uma vivencia intensa na Igreja. Padres era no colégio. E essa ligação com esses religiosos é que me fizeram pensar na possibilidade de ser padre. Existe uma pessoa, que era o diretor do colégio, qie se chamado padre Sérgio Hemkmeier. Um padre que me encantava pela sua alegria, cordialidade, amabilidade, afabilidade, pelo jeito tao generoso dele ser e acolher as pessoas. Isso me deixava muito contente. E, de repente, lá no fundo do meu coração, eu dizia: quero ser como esse homem. E eu acredito que Deus usou de uma pessoa para fazer esse chamado para mim. Eu falo que eu quero ser como esse homem, e sendo padre eu posso ser como ele. E tenho essa clara certeza de que Deus usou o padre Sergio para me chamar para a vida sacerdotal. E ele foi o grande motivo para eu seguir a minha vocação de ser padre. E é nesse momento então que eu, após ter feito o vestibular para Medicina, fiz numa escola em Barbacena, eu deixei de seguir os estudos no campo da medicina, para assumir a minha vocação religiosa.
Em foco – Como se deu a sua formação como religioso?
Padre Juarez de Castro – A formação na vida religiosa de um padre é muito intensa. Nós vivemos em estilo de internato. Nossa vida é toda dentro de um convento. Foram dez anos dentro de um convento, quatro cidades diferentes, tudo o que eu vivi na formação religiosa. É fundamental para que se torne padre o estudo de duas faculdades: Filosofia e Teologia. Não há padre que nao seja filósofo, e também não há padre que seja teólogo. Minha formação começa quando eu inicio os estudos propedêuticos. Foram dois anos de bastante estudos. Os estudos que nos introduzem na vida da Igreja, na vida religiosa, alguma formação para línguas: italiano, latim, grego, hebraico. E, logo depois, o tempo de noviciado. Este nao é um período acadêmico, mas de intensa oração e trabalho, vivendo num convento, em que dedicamos grande parte do nosso dia a trabalhar e a rezar, e a aprofundar no estudo da vida da Igreja, aprofundando em toda vida mística também.

Em foco – Quais são os seus principais referenciais teóricos no campo da teologia?
Padre Juarez de Castro – Eu fui muito influenciando por dois grandes teólogos de vertentes diferentes: Bruno Forte, teólogo italiano, considerado um dos grandes teólogos da atualidade, mas também tenho formação muito calcada em Gustavo Gutiérrez, teólogo da América Latina, que e um grande teólogo, e, na década de oitenta, junto com outros teólogos latino-americanos, que fundaram uma nova teologia, que mais tarde ficou muito estigmatizada como Teologia da Libertação. Na verdade, são teólogos que tem trabalhos maravilhosos. Gosto muito de Leonardo Boff, grande teólogo, que continua nos fornecendo teologia de alto nível. E, nao dá para não citar o teólogo da atualidade, que é Bento XVI, que além de ser o Papa, um homem de uma profunda erudição e de uma teologia impecável.
Em foco – Como você analisa a relação da Igreja com a sociedade brasileira?
Padre Juarez de Castro – A Igreja Católica no Brasil é, e sempre será, uma referencia no Brasil. Assim como no Ocidente a Igreja mudou a maneira de pensar, a condução da ética, do direito, das relações sociais, aqui no Brasil não foi diferente. Você não vê a história do Brasil sem a presença da Igreja. O nosso jeito, a nossa maneira, a nossa espiritualidade, a nossa religiosidade, ela foi profundamente marcada pela Igreja. E é a Igreja que esteve nos grandes momentos do Brasil. Momentos de mudança, momentos de maior sensibilidade política, se observa a presença da Igreja. A Igreja está marcando ainda na vida das pessoas com esta lucidez do pensamento e da condução do povo, no qie diz respeito a espiritualidade, a política, a maneira mais honesta de se ver as coisas.
A grande crítica que se faz a Igreja é quando se comenta que a Igreja está diminuindo. Porque hoje nós temos mais outras Igrejas surgindo. Isso não é uma preocupação da Igreja. A Igreja não é um clube que precisa de sócios. Nunca foi preocupação da Igreja que ela tivesse número grande de membros. O que é importante é saber que a Igreja está cumprindo o seu papel de nos trazer a presença amorosa de Deus, de trazer o Evangelho a boa notícia para que as pessoas possam conseguir viver melhor e fazer com que tenhamos um mundo justo, com menos sofrimentos, um mundo profundo com Deus. Não importa se temos um grande número de pessoas ou pequeno. A Igreja continua a ser aquela mesma fundada por Jesus Cristo há dois mil anos atrás. A Igreja que é baseada na Escritura, na tradição, e no chamado Magistério da Igreja. Portanto, é uma Igreja madura, que sabe o que fala, que sabe o que faz.

Em foco – Qual é a sua posição em relação a Teologia da Libertação?
Padre Juarez de Castro – Hoje a Teologia da Libertação é muito estigmatizada. E as pessoas não conhecendo, não lendo, não sabendo o que é, usam ela até como xingamento. Querem xingar alguém dizem: você é da Teologia da Libertação. Ou você é um comunista. Ou seja, as pessoas não sabem. Quando eu vejo alguém fazer algo desse tipo, xingar o outro, porque ele gosta ou estuda Teologia da Libertação, eu vejo claramente que é uma pessoa que não lê. Ou não leu. Eu tenho muito medo daquela pessoa que não leu o livro, e somente se baseia naquilo que ele vê, ou ouve na internet. A Teologia da Libertação, segundo o Papa Joao Paulo II, em um dos seus pronunciamentos, ela é útil e necessária. E a Teologia da Libertação foi um momento na história da Igreja que fez com que a América Latina pudesse pensar sobre a sua teologia, sobre os seus povos, como a Igreja se deu aqui na América Latina. Foi um momento importante porque toda a teologia é de libertação. A teologia que nos traz Deus é para nos libertar, libertar do pecado, daquilo que nos aprisiona. Então, toda teologia é de libertação. Então, quando falamos da Teologia da Libertação estamos falando muito de um jeito latino-americano de viver, celebrar, e também de conduzir a Igreja numa parte específica do mundo que é a América Latina. Houve exageros?! Sim! Muitos! Pessoas que abandonaram aquilo que os teóricos da Teologia da Libertação falavam e começaram a impor um método diferente daquilo que a Teologia da Libertação falava. Foi quando se começou a usar métodos do tipo marxista. Mas isso não invalida a Teologia da Libertação. Ela foi útil e necessária, parafraseando o Papa já citado. Em dado momento da nossa história foi muito útil e necessária. Hoje superamos esse tipo de pensamento, onde delimitamos a Teologia, a um pedaço do mundo, e não podemos falar de teologias de determinados lugares, mas falamos de uma teologia mais ampla. Volto a repetir: a Teologia da Libertação fez com que pensássemos mais, refletíssemos mais, e, principalmente, que tivéssemos um olhar preferencial pelos pobres.
Em foco – Enquanto religioso, homem da Igreja, como você vê os gays, a questão da homossexualidade?
Padre Juarez de Castro – Eu vejo os homossexuais, os gays, como a Igreja vê. Nós não separamos, dividimos as pessoas pelo que elas creem, por aquilo que elas fazem, pela sua orientação sexual, por sua orientação política. Nós somos todos filhos amados de Deus. Isso é muito importante para nós refletirmos. Deus olha para nós. Deus está nos olhando. Ah, você é desse partido! Ah, você é homossexual! Ah, você é heterossexual! Deus não olha dessa maneira. Somos todos amados por Deus. O catecismo da Igreja é de que haja muito respeito e acolhimento de todas as pessoas e homossexuais. Eu volto a dizer o que o Papa dizia com muita certeza. Aliás, ele respondia a uma outra pergunta: quem sou eu para julgar? Eu digo para vocês: quem somos nós para julgar e apontar um homossexual? Quem somos nós para julgar e apontar alguém por causa da sua orientação sexual? O importante é que nós abandonemos as armas do nosso preconceito, e que possamos olhar as pessoas como Deus olha. É assim também que a Igreja olha.

Em foco – No ano de 1989, a Igreja proibiu uma alegoria do GRES Beija Flor de Nilópolis de desfilar. Era o “Cristo Mendigo”. Como você vê a relação da Igreja com os desfiles das escolas-de-samba?
Padre Juarez de Castro – As escolas-de-samba tem uma ligação muito forte com a espiritualidade. Há um estudo antropológico que nos traz uma clareza de conhecimento sobre como funciona um desfile de escola-de-samba. Nesse estudo, ele diz que os desfiles reproduzem, de uma certa forma, o que as procissões faziam. Se você olhar um desfile você ira ver ali de certa forma muito clara como eram as procissões das Igrejas. Geralmente, as procissões acontecem com alas. Tem o pessoal do apostolado da nação, os dos filhos de Maria, a ala dos irmãos do Santíssimo. E assim as escolas-de-samba também possuem as suas alas, que sao bem delimitadas. Nós temos o andor nas procissões, e os carros alegóricos nos desfiles. Então, há uma ligação muito próxima das escolas com as procissões. E o que a escola-de-samba nos retrata? Aquilo que nós vivemos. Então, ela vai trazer a espiritualidade, a religiosidade, os costumes, as manias, as belezas, e os defeitos também. É muito bonito isso. Quando aconteceu o fato do ano de 1989, foi lamentável! Mas, foi uma época. Se via aquilo não pela escola-de-samba. Na época, Dom Eugenio Sales ficou um pouco chocado com a imagem do Cristo que sairia naquela escola. Mas porque ele teve a impressão de que aquela imagem poderia ser vilipendiada, descaracterizada, desrespeitada. Mas nao que tivesse algum problema que ela saísse no meio de um desfile. Foi por isso que aconteceu. Mas hoje estamos em outros momentos. O pensamento já evoluiu. Ha várias escolas que trazem histórias bonitas, religiosas e não há nenhum problema. Em São Paulo, a Agremiação Unidos da Vila Maria no ano de 2017 apresentou um enredo sobre a história de Nossa Senhora de Aparecida. E, foi um desfile muito bonito.
Em foco – Quais são os seus planos futuros? E, para finalizar, deixe uma mensagem para a sua comunidade de fiéis.
Padre Juarez de Castro – Meus planos para o futuro é estar nas mãos de Deus. Estar a disposição daquilo que Deus me pede. Eu tenho um trabalho intenso na televisão. Eu faço dois programas diários na televisão na rede Vida. Faço programa diário de rádio na rádio Capital. Tenho trabalho grande na internet, sobretudo no youtube. Tenho dedicado grande parte do tempo aos livros que escrevo, num total de doze já publicados. Estou preparando um novo livro. E, tem também a paróquia. Eu sou pároco da Paróquia Assunção de Nossa Senhora. Meus planos são os planos de Deus. Deixo nas mãos dele. Mensagem de alegria e de felicidade que o Natal nos traz. Lembrar o Natal não como mais uma data que nós celebramos anualmente, mas celebrar a vinda de Deus aqui no nosso meio. Deus que veio na nossa história e no nosso tempo. Isso marca a nossa vida porque nos lembra o fundamental: Deus não está longe. Ele está perto, próximo.
Fotos: Arquivo pessoal/ Divulgação