Sobre Nina Bassoli:
Arquiteta, pesquisadora e curadora, Nina Bassoli (1983) é responsável pelo projeto “Architettura, Rigenerazione Urbana e Città” (Arquitetura, Regeneração Urbana e Cidade) na Triennale di Milano. Doutora pela Universidade IUAV de Veneza, formou-se no Politécnico de Milão, onde hoje dá aula de Projeção Arquitetônica. É redatora da revista “Lotus International” desde 2008, teve palestras e conferências em várias universidades e instituições internacionais. É curadora de numerosas publicações e exposições, entre elas: “Arquitecture as Art” no Pirelli HangarBicocca e “City after the City. Street Art” no âmbito da XXI Exposição Internacional de Triennale di Milano.
Em Foco – Conte um pouco sobre sua formação acadêmica e a vida atual de Nina Bassoli.
Nina Bassoli – Sou arquiteta, estudei em Milão, minha cidade na Itália, na Universidade Politécnica. Depois, estudei um ano em Lisboa – esse é o motivo de saber falar um pouco de português com esse sotaque lusitano. Também fiz um PhD em Veneza, na UAV, a Universidade de Arquitetura de Veneza, isso foi algo muito interessante, que tive a oportunidade de estudar. Além disso, tive uma experiência longa no campo editorial, com a revista Lotus International e a oportunidade de criar e dirigir diversas exposições. Claro, o histórico como criadora e com a equipe do editorial foi muito importante para me fazer chegar onde estou agora na Triennale di Milano. Criei algumas exposições já na Triennale nos últimos anos, até maio de 2022, como chefe responsável pelo setor de arquitetura na Triennale di Milano.
Em Foco – Como surgiu o projeto arquitetura, renovação urbana e cidade da Triennale di Milano?
Nina Bassoli – Triennale di Milano sempre foi uma instituição com uma abordagem multidisciplinar, iniciada há cem anos – estamos no centenário da Triennale. Sempre foi o encontro de variadas artes, como arquitetura, arte contemporânea, design, design industrial, design de produto, design gráfico, fotografia e, também, teatro, já que a Triennale di Milano tem seu próprio teatro. Então, digamos que o departamento de arquitetura sempre foi muito importante para a Triennale, mas também como um ponto de cruzamento entre as disciplinas. E sobre o foco em regeneração urbana, é algo que pensamos recentemente que merecia ser apontado na agenda da instituição. Então, esse é o motivo de não ser apenas arquitetura, mas também regeneração urbana das cidades.
Em Foco – O seu ponto de vista da arquitetura brasileira?
Nina Bassoli – Eu não sou uma especialista em arquitetura brasileira, mas o que eu posso dizer é que houve um período, na segunda metade do século XX, em que ambas as arquiteturas (brasileira e italiana) estavam na mesma direção, com modernismo e com a modernização do país, que eu acho bem interessante. A ideia de juntar ideais e desafios modernos e utopias e as tradições do país, fortes na Itália e no Brasil, é algo que me fascina muito. Eu penso, por exemplo, na Lina Bo Bardi – claro, italiana, mas também brasileira, que é uma das minhas arquitetas favoritas no mundo todo, de todos os tempos. Eu acho que esse, digamos, duplo histórico entre Itália e Brasil, e entre o moderno e, de alguma maneira, a cultura popular e tradicional, é algo que nós ainda temos que ter em mente. O que eu acho incrível e muito interessante na minha visita muito curta ao Rio de Janeiro é a relação entre os artefatos humanos e a natureza. De uma maneira muito forte, a natureza está dominando o meio urbano. É realmente uma demonstração, uma manifestação, do que a arquitetura deveria ser e o que a arquitetura é – arquitetura é sobre o ambiente natural, nós não podemos pensar na arquitetura como algo ao lado da natureza, mas como algo dentro dela. Isso é uma coisa que eu acredito que no Rio de Janeiro é muito evidente e esclarecedora para todos os arquitetos no mundo.
Em Foco – Como foi seu contato com os estudantes cariocas?
Nina Bassoli – Os estudantes cariocas foram ótimos! Nós tivemos uma boa discussão no final da palestra. Eu falei sobre a história da Triennale e sobre os cartazes que estão na exibição. Através desses 23 cartazes, eu falei sobre os temas da Triennale Internacional, que acontece a cada três anos em Milão com um foco, uma missão. No final, eu perguntei aos estudantes, na opinião deles, o que poderia ou deveria ser o próximo tópico da Exibição da Triennale Internacional. Então, o que poderia ser, eventualmente, o assunto interessante para discutir dessa maneira tão interdisciplinar. Daí, a discussão foi bem interessante e eles falaram sobre alguns temas que realmente poderiam estar na agenda da próxima Triennale, como arquitetura aborígene, arquitetura nativa, como se desenvolvem os espaços urbanos dentro das favelas, ou o diálogo e entendimento das diferenças e diversidade. Eu acho que esses são alguns dos assuntos mais interessantes que poderiam ser desenvolvidos na instituição e é ótimo que isso veio dos estudantes, com uma voz muito simples eles expressam algo que pode estar na agenda da instituição.
Em Foco – Como se sente em ter sido nomeada embaixadora da Italian Design Day?
Nina Bassoli – Sim, foi uma grande honra. É uma grande honra representar meu país no mundo e representar a Triennale. Acredito, como já disse no início da primeira pergunta, na troca de disciplinas, conhecimentos, no encontro de culturas. Então, acho que para falar sobre o design tradicional de uma nação, é a melhor coisa fazê-lo em outro país, no encontro de conhecimento e com outra cultura. Essa é a razão principal de estar tão feliz e honrada de falar sobre o design italiano e a cultura do design do meu país no Brasil, no Rio de Janeiro e em Curitiba, que visitei pelo mesmo motivo.
Em Foco – Em relação à sustentabilidade qual é o seu ponto de vista?
Nina Bassoli – Sobre a sustentabilidade, tenho que responder, novamente, de uma maneira parecida. Nós estamos, agora, em uma fase de desenvolvimento, de criação de um meio da arquitetura, urbanismo e design no geral em que realmente precisamos pensar na relação com os outros seres – com a vegetação, com os animais e, claro, com outras pessoas, outras culturas, ideias e tradições. Eu realmente acredito que sustentabilidade significa pensar que o projeto, e no que quer que seja que possamos projetar para o mundo, é algo que vai crescer junto a outros seres, com outras influências. Então, eu acredito que isso é pensar de uma maneira sustentável, e a troca de cultura em uma instituição de cultura pode fazer a diferença e ser algo importante nesse processo. Hoje talvez mais do que nunca.
Em Foco – Para os futuros arquitetos, uma dica de Nina Bassoli.
Nina Bassoli – O que eu posso dizer a futuros arquitetos é isso: por favor, ouçam o que o mundo está dizendo, ouçam o que as pessoas, plantas e animas, até em outras línguas, estão dizendo. Tentem entender o que está em volta de vocês, mesmo se não for sempre fácil. Tentem projetar pensando que, o que vocês estão vivendo no mundo, esse projeto vai crescer com esses “outros”.
Em Foco – Uma referência na arquitetura mundial, uma personalidade ou algum projeto.
Nina Bassoli – Como referências, já falei sobre a Lina Bo Bardi e já disse que é uma das minhas favoritas. Acho que ela pode ser mencionada como uma heroína. Gostaria de fazer um paralelo com uma arquiteta italiana, Gae Aulenti. Eu tenho certeza de que Gae Aulenti visitou, no Brasil, o trabalho de Lina. Mas eu queria mencioná-la por que ela tinha, de uma maneira semelhante, uma abordagem multidisciplinar para a matéria, trabalhando em revistas, nos campos de cultura e instituições e, claro, como arquiteta, mas também designer, no teatro e na relação com outras pessoas. Então, a mensagem é: ser arquiteto significa estar em relação com as disciplinas e culturas. Elas são duas mulheres, talvez não seja só por acaso.
Em Foco – Tem alguma coisa em mente para acontecer recentemente?
Nina Bassoli – Eu estou trabalhando em uma exibição para o centenário da Triennale que se chama “Home, Sweet Home” (“Lar, Doce Lar”) e o tema é falar sobre a história do conceito de casa através das exibições feitas na Triennale. Mas o assunto que chega é sobre a casa e o lar hoje, sendo relacionado com o trabalho doméstico do cuidado – o que, basicamente, foi feito por mulheres até agora, mas que nós podemos tentar entender o que é importante no trabalho de projetar casas. Então, é um tipo de manifesto na ideia de cuidado e manutenção e na ideia de que projetar é sempre transformador. Não é só quando projetamos uma casa, que projetamos uma casa; mas também quando a limpamos, também fazemos parte do processo do projeto, também, claro, quando a habitamos a transformamos e projetamos.
Em Foco – Uma frase que marcou sua vida.
Nina Bassoli – Eu gostaria de citar Anaïs Nin, a escritora francesa. Ela diz algo como “nós não vemos as coisas como elas são, nós as vemos como nós somos”. A ideia é que a realidade não, é algo separado de nós, mas a realidade somos nós. Nós somos parte da realidade e realidade está aos nossos olhos.
Foto: Arquivo pessoal /Divulgação