Uma viagem fascinante pela história da literatura ocidental, desde os primórdios da palavra escrita até os tempos mais recentes, entre raridades e primeiras edições, como “A epopeia de Gilgamesh”, “A Bíblia Sagrada”, “Ilíada”, “Em busca do tempo pedido”, e “Ulisses”, através dos olhares e textos de Jorge Luis Borges.
É o que propõe a exposição Nova Babel (In)finita, que estará na Academia Brasileira de Letras a partir de 31 de outubro. As 300 obras expostas pertencem ao acervo do médico, escritor e bibliófilo gaúcho Gilberto Schwarstmann. A curadoria é de Fagundo Sarmiento.
O fio condutor da mostra é o conto de Borges “La Biblioteca de Babel” (1941), concebido a partir de um pesadelo sobre uma biblioteca onde ele trabalhou por um tempo. Uma biblioteca que lembra os infinitos hexágonos. Borges descreve uma biblioteca que “equivaleria ao Universo… composta por um número indefinido, talvez infinito, de galerias hexagonais…A Biblioteca é infinita, só pode ser obra de um deus… “A Biblioteca de Babel abarcaria todos os livros e o Universo estaria justificado.
Os livros são exibidos em vitrines especiais, com iluminação adequada a medidas de segurança para preservação das obras.
Além das vitrines, a exposição conta com painéis e vídeos, com textos de Jorge Luis Borges e explicações sobre as obras ali expostas e ilustrações da artista plástica Zoravia Bettiol, com imagens pertencentes ao universo borgiano como os tigres, os labirintos e os espelhos.
Jorge Luis Borges escreveu sobre a maioria dos livros e escritores da mostra: “A Divina Comédia”, “Dom Quixote”, a dramaturgia de Shakespeare, “Decameron”, Montaigne, Beaudelaire, Honoré de Balzac, Victor Hugo, Charles Dickens, Kafka, Proust, James Joyce, entre outros. Uma ala especial é reservada às primeiras edições dos grandes escritores brasileiros e latinos como Garcia Marquez, Fernando Pessoa, Eça de Queiroz, Saramago, Machado de Assis, Guimarães Rosa e Mario de Andrade.
A erudição dos textos de Borges possui certa identidade com a Divina Comédia, de Dante Alighieri, pois em ambos parece haver o domínio da mitologia, religião, história, filosofia, geometria, matemática e astrologia, bem como da arte da metáfora. Como diz Eliot, “um autor é todos os autores que o antecederam”. A perfeita descrição dos tipos humanos, na dramaturgia de Shakespeare, parece completar-se no Em busca do tempo perdido, de Marcel Proust, em seu mergulho no “lago desconhecido” da psicologia humana, apoiado nos estudos sobre o subconsciente, de Sigmund Freud.
Borges faz várias referências à A epopeia de Gilgamesh, um épico babilônico escrito há quase três mil anos. A obra fala de aventuras, morte, natureza e seres imaginários. Diz que a teologia é mais rica que a literatura fantástica: “a Trindade é mais estranha que o Unicórnio”. Defende um saber coletivo, semelhante à construção da Bíblia Sagrada – em especial O Novo Testamento – por ele considerada fundamental em nosso cânone literário. Borges diz que “para se ter uma imagem do que seria o universo grego, a Ilíada é uma obra fundamental, comparável ao papel da Bíblia Sagrada para a civilização ocidental.
O escritor revela um apreço especial pela obra As Mil e Uma Noites (circa 900 d.C.), uma maravilhosa coleção de histórias de origem árabe, mas também indiana e persa, que faz parte de nosso imaginário, tendo servido de inspiração a muitos de nossos clássicos. Diz Borges: “A Mardrus atribuímos a virtude moral de ser o tradutor mais fiel das Mil e Uma Noites, livro de admirável lascívia, antes escamoteada aos compradores pela boa educação de Galland ou pelos melindres puritanos de Lane. Um documento do século IX, o Fihrist, traduzido do persa ao árabe, inspira a primeira história de As Mil e Uma Noites: o juramento desolado do rei que a cada noite desposa uma virgem, que manda decapitar ao amanhecer, e a resolução de Scherazade, distraindo-o com histórias maravilhosas, até que sobre eles tenham passado mil noites. Essa ficção – para Borges – é superior às vindouras e análogas da piedosa cavalgada dos Contos de Canterbury, de Chaucer, ou da epidemia do Decameron, de Giovanni Boccaccio.
A curadoria de Facundo Sarmiento empresta um ar borgiano e misterioso à mostra. “Ao abrir asas e voar para a Academia Brasileira de Letras – a mostra esteve antes na Academia Nacional de Medicina – os livros expostos trazem um recorte do cânone literário ocidental, permeado pelo olhar borgiano. Utilizei outro belo conto de Borges, “O Aleph”, que descreve uma pequena pedra verde, escondida no sótão de uma casa, com a qual se pode enxergar o cosmo”, explica Facundo Sarmiento.
No final, o visitante recebe uma carta lacrada do curador com algumas informações sobre a exposição e a revelação de sua verdadeira identidade. É preciso ir até o fim para descobrir!
Fotos: Cristina Lacerda
Nova Babel (In)finita
Acervo do bibliófilo Gilberto Schwarstmann
Ilustrações Zoravia Bettiol
De 01 de novembro a 31 de janeiro
Abertura: 31 de outubro às 18h
Visitação: segunda a quinta, das 10h às 18h
Academia Brasileira de Letras
Av. Presidente Wilson, 203/1º andar – Castelo – Rio de Janeiro/RJ
Entrada franca
Mais informações – Ester Lima – 21-99161-1184