A peça narra o diálogo entre um pai e um filho. O primeiro está acometido pela doença de Alzheimer e irá passar um fim de semana na casa do segundo. Há algum tempo que os dois estão afastados, bem pouco próximos e íntimos. E o reencontro acaba sendo marcado por esse distanciamento do tempo, em que rusgas e desentendimentos anteriores são trazidos a tona.
O ator Ilvio Amaral faz um pai, seu Hélio, já passando por estágios avançados da doença. Ele chega a residência do filho com uma mala, na qual diz trazer todo o dinheiro que existia na sua conta corrente, e assim não teria a preocupação de ser roubado. E com ele vinha também todas as consequências do Alzheimer. Seu Hélio apresenta uma das mãos tremulas, é inquieto, repetitivo, só lembra do passado, e de nada do presente. É um homem sem futuro. O tempo todo “olha para trás”, para um momento que já passou. Só lembra e chama por Alice, sua esposa que já falecera. Solicita incessantemente por bebida alcoólica, cervejinha. Apresenta-se sempre irritado. Mostra sinais de demência, típico de um homem enfermo.
Maurício Canguçu faz o filho Mauro, que não via o pai há algum tempo, pois ele estava na residência da sua irmã, quem o cuidava. Ele o recebe de forma fria e distante. Já não tinham proximidade, nem afinidade. E esse afastamento acaba marcando o reencontro. Mauro guarda mágoas, e muitas das vezes é impaciente com a figura paterna. Não compreende as condições atuais em que ele se encontra. Briga, discute, tenta amarrá-lo, e o ameaça de colocar num asilo.
O reencontro é, portanto, tenso, conflituoso. Não há afeto nem carinho por parte de Mauro, que chega a ser grosseiro em alguns momentos. Lhe falta paciência, tato para saber lidar com o doente. Num determinado momento sugere ao pai que se jogue da janela do quinto andar, pois nada sentirá ao se chocar com o asfalto, uma vez que não tem mais sensibilidade alguma. E, ainda diz que é um insano.
Contudo, nesse momento tenso do reencontro, enfrentando estranhamentos e revivendo fatos pretéritos, pai e filho se redescobrem e ressignificam seus afetos e memórias. Buscam nesse momento refazer a amizade entre ambos, mesmo sendo um momento excepcional. É um momento tenso, difícil, mas marcado por uma tentativa de buscar uma normalidade, um apaziguamento.
Os dois atores estão perfeitos, entrosados, numa sintonia total. Se conhecem, pois já atuaram em outras produções teatrais. Dominam o texto e o palco. Realizam interpretações adequadas, convincentes, e passam o texto com clareza, emoção, e sensibilidade.

A direção de Jair Raso busca deixar os atores a vontade no palco. Não há nada que interfira em suas atuações. Ele foca no texto, e na atuação e interpretação dos atores.
O texto de Jair Raso reflete sobre questões importantes como tempo; as relações passado, presente e futuro; memória individual e familiar; e, sobretudo, afeto e carinho.
Os indivíduos afetados pelo mal de Alzheimer não estão mais no mundo presente, pois a memória recente já se perdeu. Vivem no passado, até perdê-la por completo e vegetarem. É um outro tempo, um outro universo. E, precisam ser compreendidos, tratados com amor e afago. Essa é a mensagem presente no texto.
Ainda que se trate de um tema sensível, o autor faz de forma humorada e delicada. Não é tratado de forma dura, nem muito menos sublinhando os sofrimentos dos acometidos pela doença. Apresenta uma mensagem de esperança, que mesmo nas adversidades, podem surgir momentos de alegria e felicidade, podem ser reconstruídas relações que estavam feridas, magoadas, despedaçadas, e podem ser restabelecidas. Pois, acima de tudo, o amor e o afeto devem imperar nas relações humanas.
Os figurinos criados por Andréa Raso são adequados, roupas do dia-a-dia.
Por sua vez, a cenografia também criada por Andréa Raso é a residência de Mauro, bem solucionada, e com objetos dispostos adequadamente, sobretudo na sala, com sofá, mesa com cadeiras, e um quadro com paisagem lembrando um jardim. Mauro era paisagista, cuidava desses espaços verdes, embora seu pai quisera que ele fosse um advogado.
A iluminação criada por Marina Arthuzzi e Jair Raso é adequada às diversas cenas do espetáculo.
Maio, Antes que Você me Esqueça é uma peça que tem uma dupla de ótimos atores, trata um tema sério de forma leve e emotiva, e uma dramaturgia que resgata valores como afeto e carinho.
Ótima Produção Teatral!
Texto redigido por Alex Gonçalves Varela.