A produção teatral é um musical alegre, poético, original, potente, que retrata a vida na imaginária comunidade do morro do Sol, toda a sua diversidade, sua gente, seus costumes, suas tradições, sua cultura, seu vocabulário, seus problemas, como violência, e falta de estrutura.
O musical é carioca, pois é ambientado na cidade do Rio de Janeiro. O texto, cuja concepção e adaptação é de Juliana Pedroso, narra uma trama que tem como personagens centrais dois jovens cariocas de realidades bem distintas e seus desafios.
De um lado, temos Miguel, interpretado por Bhener, jovem que reside na referida comunidade com a sua família, que inclui sua mãe dona Lúcia, interpretada por Andrea Marquee, e sua irmã Júlia, interpretada por Carol Botelho. Ele perdeu um irmão, Diego, vítima de uma operação da segurança pública na comunidade. Ainda que leve uma vida difícil, ele encontra na música um alento, inclusive compartilhando com as crianças da comunidade.
Por sua vez, Daniel, interpretado por Cadu Libonati, é um jovem de classe média, filhinho de papai, graduando da PUC-Rio, que tem tudo de bom e do melhor, e reside em Copacabana, bairro da zona sul, área nobre da cidade.
Numa noite de réveillon, os dois estavam numa festa de comemoração na comunidade, quando aconteceu uma briga e acabaram se envolvendo. O policial de plantão interviu, e o grupo todo foi levado para a delegacia.
Ao ser detido, Daniel entrou em contato com seu pai, que ao ser comunicado ficou entristecido com mais uma das bagunças do filho, e como repreensão não o deixou retornar para casa.
A partir desse momento, ocorre a aproximação entre os dois personagens, ocasião em que Miguel oferece a Daniel um quarto de sua residência na comunidade para o mesmo alugar. Daniel então irá conhecer uma outra realidade, um outro mundo, o espaço de uma área carente.
Daniel passa a residir na comunidade junto a família de Miguel. Júlia, a irmã deste último, se aproxima de Daniel. Ela o leva para conhecer a comunidade, uma vez que é nascida e criada naquele território. Assim nasce uma paixão.
Júlia é uma garota trabalhadora. Tira os seus rendimentos da barraca onde labuta, e está estudando para conseguir ser aprovada no vestibular para o curso de Medicina.
Certo dia, um agente de segurança pública da comunidade agrediu Miguel, lhe dando socos na cabeça. Daniel presenciou a agressão, filmou, e divulgou nas redes sociais com o intuito de denunciar o ocorrido.
Foram momentos difíceis para Miguel, sobretudo quando teve a notícia do falecimento de Carlito, interpretado por Kaue Penna.
Contudo, a atitude de Daniel colocou em risco a vida dele próprio e a de Miguel. E resultou no retorno de Daniel para a sua residência.
Contudo, o amor falou mais alto. Julia foi ao encontro de Daniel. Os dois se auto declararam. Eles retornaram o namoro, bem como o retorno de Daniel para a comunidade do morro do Sol. Julia conseguiu ser aprovada no vestibular. O amor uniu mundos separados, o asfalto e a comunidade.
Daniel, Miguel e Júlio têm uma atuação contundente. Eles interpretam, cantam e dançam de forma adequada e correta. Narram o texto com uma linguagem simples, de fácil entendimento e compreensão. Dominam o texto e o palco. Eles apresentam corretas interpretações, e expressam emoção.

Os demais integrantes do elenco complementam e mantem o nível de qualidade da atuação daqueles que já foram comentados. Cantam, dançam e interpretam muito bem. Eles são jovens, dinâmicos, e, em sua maioria, pretos, fato que deixa transparecer a inclusão cada vez mais intensa desse segmento social nas produções artísticas.
Destaco as atuações de Dona Lúcia, interpretada por Andrea Marquee, e Gabi, interpretada por Julia Perré.
Algumas cenas ganham destaque: a do baile funk; aquela que relembra os moradores da comunidade falecidos vítimas da violência; e a do bloquinho de carnaval.
Os figurinos criados por Wanderley Gomes e Ana Elisa Schumacher são simples, bonitos, leves, coloridos e adequados. São vestimentas típicas de pessoas de comunidade. Nada de luxo! Ganha destaque figurinos brancos com tiras, lembrando aqueles usados pelo cantor Ney Matogrosso em suas apresentações.
A cenografia criada por Natália Lana é bonita, original, arrojada e adequada. Ela reconstitui o ambiente do morro do Sol, com a escadaria que dá acesso ao morro, e a imagem do Sol na parte traseira. O cenário é móvel, e se transforma na casa da família de Miguel e Júlia, e na parte de cima se transforma em laje. Há também diversos painéis pendurados que exibem projeções de imagens de acordo com as cenas.
A iluminação criada por Maneco Quinderé apresenta um belo desenho de luz, adequada as respectivas cenas, e realçando as interpretações dos atores.
A coreografia criada por Gabriel Malo e Nyandra Fernandes é intensa, criativa, bem solucionada, e apresenta bonitos desenhos coreográficos.
As músicas criadas Matt Gurren e Nanny Assis apresentam letras poéticas e melodiosas, e um conteúdo denso que facilita o entendimento da dramaturgia.
Por sua vez, a direção musical é de Carlos Bauzys, que conduziu de forma correta e adequada a interação entre elenco e músicos, mantendo entre ambos uma sintonia e ajustamento perfeitos.
Rio Up Hill é um musical que apresenta um conjunto de atores jovens e com potencial; apresenta como tema a vida numa comunidade carente carioca de forma realista, mas sem perder a ternura e a suavidade; músicas poéticas, melodiosas, e com letras densas; e, bonitos figurinos, cenografia e iluminação.
Excelente produção teatral!