Após quatro meses de intensa programação, a II Mostra Movimentos de Solo caminha para as últimas apresentações em julho, tendo trazido ao público performances e criações potentes, trocas e vivências ricas que transformaram o palco do Espaço Cultural Municipal Sergio Porto, no Humaitá, em verdadeiro território de escuta, reflexão e presença feminina. Iniciada em março, a segunda edição da mostra permitiu ao público tempo e fôlego para encontrar — e reencontrar — narrativas cênicas singulares, que colocam mulheres como criadoras e protagonistas de seus próprios espetáculos solo, entre o teatro e a dança.

Mais do que uma vitrine de espetáculos assinados e interpretados por mulheres, a Mostra se afirmou como espaço de convivência e colaboração entre artistas e espectadores. Espetáculos prontos dividiram a cena com processos criativos abertos ao público, fazendo da mostra não apenas um lugar de exibição, mas um campo de experimentação e de escuta. Trazer os processos criativos, uma etapa anterior à estreia, dá oportunidade ao público de ter uma visão privilegiada de um momento da criação em que algumas coisas ainda estão sendo experimentadas, testadas.
Na reta final da programação, ainda é possível conferir quatro apresentações que encerram esse ciclo com diversidade estética e densidade poética. Confira a agenda:
FANTASIOSA EXPOSIÇÃO DA PALAVRA
Com Cecilia Ripoll – 18 de junho, às 19h30
Num mundo dominado por símbolos e imagens nos meios de comunicação, estaria a oralidade perdendo sua força vital? Ou, do contrário, ganhando ainda mais força? Em meio à crise, palavras decidem se reunir em assembleia para debater sobre a forma como os humanos vêm fazendo uso delas. Texto e atuação de Cecilia Ripoll, direção de Juliana França e Cecilia Ripoll, realização Grupo Gestopatas.

O MUSEU SEM FIM DE 1976 – SALA 2 (processo + conversa)
Com Daniele Avila Small – 25 de junho, às 16h
Em uma conversa entre artistas e público, Daniele Avila Small vai apresentar uma etapa do processo criativo da segunda parte do projeto O museu sem fim de 1976 (uma visita guiada a uma exposição imaginária de obras criadas por mulheres artistas e pensadoras em 1976). Nesta ocasião, ela vai compartilhar ideias referentes à sala 2.

QUEM MATOU SPALDING GRAY? (processo)
Com Liliane Rovaris – 9 e 16 de julho, às 19h30
No fim de semana de 10 de janeiro de 2004, Spalding Gray, ator e dramaturgo estadunidense conhecido por seus solos autobiográficos, deu fim à sua vida ao pular da balsa de Staten Island em Nova York. Nesse mesmo fim de semana, Daniel MacIvor, ator e dramaturgo canadense, estava na Califórnia, se consultando com um cirurgião espiritual que salvou a sua vida, removendo uma entidade que tinha se ligado a ele. Conectando estas duas histórias reais paralelas, a peça conta uma terceira história, ficcional, que entrelaça as obsessões de Spalding Gray com as invenções de Daniel MacIvor: a história de um homem chamado Howard, que não se lembra mais como viver.

DANÇA MACABRA
Com Laura Samy – 23 de julho, às 19h30
Dança macabra é uma performance solo criada a partir de reflexões acerca das representações do macabro, da morte e da sobrevivência. Um processo de investigação de diferentes formas de resistência e expressão frente à morte ou à mortificação de algo. A dança macabra do período medieval não define precisamente uma temática mas um ponto inicial que impulsiona uma série de articulações e pensamentos, aproximando pistas que remetem a tempos, formatos e contextos diversos: a dança macabra, a morte do cisne, a voz de Pasolini, um poema de Henri Michaux ou um fantoche de uma loja de brinquedos assustadores… referências históricas, cinematográficas, literárias ou sonoras. Desses deslocamentos, surge a Dança Macabra, construindo o espaço da cena, superfície sobre a qual o gesto se inscreve, a imagem se imprime e onde podemos jogar com a experiência da aparição e da desaparição desses gestos/imagens. A presença é colocada como questão.

Durante os últimos quatro meses, o público carioca teve acesso a obras e processos de artistas como Lorena da Silva, Soraya Ravenle, Maria Clara Vale, Ana Schaefer, Tracy Segall, Ludmila Rosa, Denise Stutz, Stella Rabello, Daniele Avila Small, Tainah Longras, Carolina Cony, Cecilia Ripoll, Liliane Rovaris e Laura Samy. Solos que já circularam em outras temporadas encontraram novo fôlego, e trabalhos em andamento se colocaram em diálogo, gerando uma pulsação que ultrapassou as bordas da cena: fomentou debates e fortaleceu a rede entre artistas mulheres. Mais do que uma mostra, Movimentos de Solo foi um gesto coletivo, um espaço simbólico e real de pertencimento e criação para mulheres nas artes cênicas. Ao abrir as portas para esses corpos e vozes, o Espaço Sergio Porto reafirma seu papel como espaço de resistência e de escuta. E nos lembra que quando o teatro se faz espaço de encontro e de cuidado, ele se torna um ato político — e profundamente transformador.
SERVIÇO
II Mostra Movimentos de Solo
Espaço Cultural Municipal Sergio Porto
Rua Humaitá, 163 – Humaitá (Entrada pela rua Visconde Silva)
Às quartas-feiras (confira os horários de cada espetáculo).
Ingressos:
riocultura.eleventickets.com
Outras informações: @movimentosdesolos e @trilhasdacena
Texto: Rodolfo Abreu (@rodolfoabreu)
Imagens: Divulgação