Num tempo pretérito, que se convencionou chamar de período medieval, a religião perpassava todos os campos da vida em sociedade. A Igreja era a instituição máxima, dando as coordenadas do mundo social. O Papa era o Sumo Pontífice, a autoridade máxima religiosa. Os letrados eram os religiosos, que falavam e liam em latim. O livro das Sagradas Escrituras era a fonte a ser lida. Bastava abrir a Bíblia que o conhecimento era revelado ao homem.
Esse mundo fortemente marcado pelos valores religiosos foi chamado de “idade das Trevas”. Contudo, essa expressão já passou por uma profunda crítica, uma vez que o medievo teve também “lampejos de luz”, como o período do Renascimento Carolíngio, e o dos séculos XII e XIII, quando o homem medieval travou contato com os textos clássicos da antiguidade greco- romana. Portanto, houve momentos de “luz”, não só escuridão.
Foi nesse mundo que o filósofo, escritor, bispo e teólogo cristão Santo Agostinho (354 d.C.-430 d.C) viveu. Ele era um religioso, um letrado daquela sociedade medieval. Redigiu inúmeras obras, dentre as quais mencionamos Confissões. Tendo como base essa produção textual medieval, o ator Eduardo Rieche encena um excelente monólogo, que comemora quinze anos da sua primeira apresentação, ocorrida na data de 04.11.2008 na Casa de Cultural Laura Alvim. Eduardo também é o responsável pela dramaturgia da peça.
Eduardo faz uma apresentação cuidadosa e criteriosa da referida obra do Santo, trazendo para a cena questões importantes, que inclusive continuam sendo discutidas no nosso mundo contemporâneo. Dentre os temas destacamos a questão da mortalidade humana, do tempo, quem é Deus, apetites sexuais, adultério, pecados, memória/esquecimento, teatro, conhecimento/fé, entre outros. Ele amarra todos esses temas a partir da seleção de passagens da já referida obra, costurando um texto de fácil compreensão e não monótono.
Eduardo realiza uma apresentação segura. Ele tem o domínio do texto. Apresenta com singeleza, sobriedade, e com uma boa retórica. Aliás, Santo Agostinho era professor de retórica.
A direção é de Henrique Tavares. Ele foca no texto, e na atuação e interpretação do ator. Ele deixa Eduardo a vontade no palco, para livremente realizar a sua performance.
O figurino utilizado por Rieche é uma criação do talentoso Mauro Leite, cuja marca é o bom gosto. O figurino é inspirado em trajes de monges da idade média, e a cor é branco.
Por sua vez, o cenário é de Doris Rollemberg. Simples e correto, ele é constituído por um tapete e umas caixas de acrílico com água, areia, uma pedra, e uma pêra, são os elementos da natureza.
Quem tem interesse em conhecer o pensamento de Santo Agostinho, o caminho é o teatro Poeira!
Excelente produção cênica!
Texto redigido por Alex Gonçalves Varela.