De acordo com o historiador francês Pierre Chaunu, nos inícios do século XIII começou a germinar o processo de “desencravamento planetário”, quando o europeu saiu do miolo da Europa. Era numa estreita banda de terra (7% das terras emersas), que se concentravam 70% dos homens, entre os séculos XIII a XVI. Ademais, as distâncias pareciam afastar a possibilidade de entrada em comunicação. As “Grandes Navegações” desencravaram essas diferentes humanidades, abrindo o Atlântico, e possibilitando a multiplicação do nível de troca e das comunicações que a Europa conheceu a partIr do século XVI.
A partir desse momento, o mundo entrou em comunicação. Teve início a chamada globalização do século XVI, momento em que houve, segundo o historiador francês Serge Gruzinski, “a proliferação de todos os tipos de vínculo entre partes do mundo que até então se ignoravam ou se relacionavam com enorme distância”. Ela abrangeu ao mesmo tempo a Europa, a África, a Ásia e o Novo Mundo, que passaram a interagir. Os protagonistas dessa globalização foram os ibéricos e os italianos que forneceram o essencial da energia religiosa, comercial e imperialista no quinhentos.
As conexões entre as partes do mundo se aceleraram. A aventura marítima foi responsável pela rutura do isolamento. E, o século XVI foi o momento da verdadeira conquista.
O processo de domínio dos povos e terras encontrados foi marcado pela exploração incansável, por uma conquista perpétua, e uma exploração abusiva sobre as fontes de riqueza. O europeu veio em busca de riquezas. Queriam encontrar ouro e prata. E, no Novo Mundo, os espanhóis conseguiram encontrar os metais desejados nas regiões do vice-reinado de Nova Espanha, e no do Peru. Dessas duas regiões sairia um grande afluxo de metais à Europa, atribuindo ao Novo Mundo um papel de motor exclusivo no processo de acumulação primitiva, em função das quantidades de ouro e prata que este cedia à Europa.
O encontro entre o europeu e as populações locais ocasionou um verdadeiro choque cultural. Por essas terras, havia populações com sociedades bem estruradas e dinâmicas próprias. Mas, o europeu invadiu as terras, utilizando-se da violência, do saque e da pilhagem, e destrui as civilizações que por aqui existiam. Sobre as cidades existentes, eles construíram outras com feições próprias às congêneres na Europa.
Por exemplo, na região andina, Francisco Pizarro colocou em prática a conquista e invasão do território, e a destruição das culturas incaicas. Os resquícios que chegaram até nós podemos contemplar na exposição Tesouros Ancestrais do Peru, que foi inaugurada na data de 11.10.2023, nas galerias do primeiro do prédio do Centro Cultural Banco do Brasil, Rio de Janeiro.
Na mostra o que visualizamos são vestígios, testemunhos produzidos por humanidades que foram destruídas pelo homem branco, o colonizador europeu.
São 162 peças em cerâmica, cobre, ouro, prata e têxteis produzidas pelas antigas civilizações andinas até a consolidação do Império Inca. Dentre as culturas produtoras desses materiais mencionamos a Chavín, Cupisnique e Pacopampa. Moche, Nazca e Recuay, Wari, Chimu, Chancay e Inca. Este riquíssimo material pertence ao Museo Oro del Peru. A exposição tem curadoria de Patricia Arana e Rodolfo de Athayde.
Os povos andinos produziam conhecimento, e dominavam técnicas e ofícios. Entender como eles produziam esse conhecimento, e quais as suas características é de extrema importância, para não cairmos no equívoco que argumenta que as regiões andinas anteriores à chegada do europeu eram grandes vazios de conhecimento. Para também não os desqualificarmos mais, não considerarmos mais como povos inferiores.
Os povos andinos eram hábeis na mineração e na confecção de objetos. E, valorizavam o ouro e a prata não com fins necessariamente econômicos, valor monetário, mas para produzir adornos, oferendas aos mortos. Portanto, não eram bárbaros nem selvagens, nem vis, como assim os viu o homem branco.
Os povos que constituíam as referidas civilizações detinham farto conhecimento, tanto que construíram pirâmides, observatório solar, templos religiosos, muralhas, fortalezas, edifícios, cisternas, aquedutos, tumbas, desenvolveram técnicas agrícolas e de irrigação, construíram uma rede de estradas, entre outras.
As civilizações andinas não possuíam escrita. Mas foram capazes de criar uma forma de registrar e contabilizar. Criaram os quipus, um conjunto de cordas em que por meio de nós produziam algum tipo de registro.
A destruição foi desumana e inaceitável. Em nome da civilização européia, branca, cristã foram saqueados e vilipendiados. Foram acusados de idolatria, de não ter fé, viver na desordem, e não ter uma autoridade suprema. Portanto, o europeu não reconheceu o “outro” como uma humanidade diferente. Montados em seus cavalos e armados com instrumentos carregados de pólvora, invadiram a região e fincaram seus pés. Francisco Pizarro e seus homens foram violentos, destruidores, e assassinos. Inventaram o Vice-Reino do Peru para garantir a conquista e a posse da região. Restaram os fragmentos que visualizamos na exposição.
Tesouros Fascinantes do Peru é uma exposição erudita, voltada para um público especializado, letrado, como historiadores, arqueólogos, geógrafos, entre outros profissionais. Para os estudantes do ensino médio é uma grande oportunidade, pois é uma verdadeira aula de história, e o conteúdo integra as exigências do vestibular. Portanto, é uma exposição com um rico e denso conteúdo cultural.
Vem! Excelente!
Texto redigido por Alex Goncalves Varela.