As enchentes no sul do país provocaram uma situação de calamidade pública com milhares de desabrigados, pessoas desaparecidas e famílias que perderam parentes e todos os seus bens. As cidades alagadas e o trabalho dos bombeiros, da defesa civil e dos voluntários ajudando nos resgates, geraram imagens impactantes tanto para os adultos quanto para as crianças que vivenciaram essa tragédia. Mas como lidar com essa situação e explicar para uma criança o que aconteceu sem que isso afete ainda mais a sua saúde mental?
As crianças podem apresentar variados sentimentos após vivenciar uma tragédia como a ocorrida no Rio Grande do Sul. Isso vai depender de diversos fatores como a personalidade da criança, o contexto familiar, as perdas sofridas e o suporte emocional que ela vai receber após o ocorrido.
Uma criança que tenha enfrentado a perda dos pais, de um animal de estimação, dos avós ou de entes queridos pode demonstrar sentimentos como medo, raiva e tristeza e manifestações físicas como dor de barriga, insônia, febre e desconforto corporal, entre outras, o que é perfeitamente normal. O impacto de uma tragédia interrompe abruptamente a vida da criança, gerando um trauma significativo.
Por isso é essencial proporcionar um ambiente seguro e acolhedor para que ela possa expressar seus sentimentos com a ajuda de profissionais de psicologia que possam oferecer suporte para ajudá-la a compreender e verbalizar suas emoções. É importante que ela entenda que a tragédia foge do controle humano e que o luto é uma parte natural do processo de reconstrução. A comunidade e o serviço social também desempenham um papel crucial na proteção e no suporte às crianças que enfrentam calamidades.
Geralmente em situações como esta as pessoas são direcionadas para abrigos. Nesses locais é possível trabalhar com grupos de crianças proporcionando um ambiente seguro onde elas podem compartilhar experiências e sentimentos. A utilização de recursos lúdicos e atividades criativas podem ser empregados para ajudá-las a expressarem suas emoções. Além disso, é importante envolver os pais e familiares próximos para que possam apoiar a criança e estimular que ela fale sobre os seus sentimentos. Incentivar a verbalização é fundamental, pois reprimir as emoções pode levar a problemas de saúde mental e também físicos.
É importante sempre tentar explicar para a criança sobre a tragédia que ela está vivenciando, usando uma linguagem adequada à sua idade e desenvolvimento para que ela compreenda e não fique assustada. Focar nos pontos positivos, como a solidariedade e o apoio da comunidade e enfatizar as medidas que estão sendo adotadas para minimizar o problema, pode ajudar a criança a compreender a situação de forma menos assustadora.
Os pequenos que moram em outros locais e perderam parentes em uma calamidade devem ser informados sobre o ocorrido o mais rapidamente possível. É importante oferecer conforto e suporte emocional, seja pelos familiares próximos ou por profissionais especializados. A comunicação clara e amorosa é primordial para ajudar a criança a lidar com a perda, mesmo à distância.
Pessoas que moram em locais de risco constante de tragédias naturais devem ser orientadas e preparadas para emergências futuras. As crianças principalmente devem aprender procedimentos e receber treinamentos de segurança que podem ser realizados pelo Corpo de Bombeiros ou por outras entidades locais, o que pode ser uma ferramenta eficaz para que elas se sintam mais seguras e protegidas.
Andreia Calçada é psicóloga clínica e jurídica. Perita do TJ/RJ em varas de família e assistente técnica judicial em varas de família e criminais em todo o Brasil. Mestre em sistemas de resolução de conflitos e autora do livro “Perdas irreparáveis – Alienação parental e falsas acusações de abuso sexual”.