Em cartaz no Teatro Cândido Mendes, em Ipanema, Rafa Machado mergulha no mistério dos ciclos da vida com “Ouroboros”, uma performance sensorial que atravessa corpo, poesia, imagem e espiritualidade. O espetáculo nasce de um gesto íntimo — o desejo de compartilhar com o público a experiência vivida durante a filmagem de um curta-metragem de mesmo nome — e se transforma em uma jornada de autoconhecimento e renascimento. Sob direção de Alexandra Azambuja e direção de movimento de Mylena Carreiro, a atriz convida o espectador a um ritual cênico que propõe pausa, escuta e reconexão com o sentir.
Inspirado no símbolo ancestral da serpente que morde o próprio rabo — representação do eterno ciclo de morte e renascimento —, “Ouroboros” transcende o formato tradicional de espetáculo. É corpo, voz e imagem em movimento contínuo, num diálogo entre dor e prazer, sombra e luz, fé e transformação. O figurino, a música e as projeções reforçam o arquétipo da serpente e o poder feminino que percorre toda a narrativa, evocando a energia criadora e sagrada das deusas esquecidas.
Mais do que uma performance, o espetáculo “Ouroboros” é um convite à entrega. O público, parte ativa da experiência, é levado a um estado de presença, onde o tempo desacelera e o corpo se torna instrumento de escuta. As reações têm sido tão diversas quanto intensas: há quem saia em silêncio, emocionado, e quem descreva a vivência como “uma viagem guiada pelos sentidos”. Para Rafa, esse é o verdadeiro propósito da obra — provocar um despertar. “É sobre lembrar o espaço que somos e habitamos”, diz a artista, que faz do palco um espelho das próprias transformações.
Como surgiu a ideia original de “Ouroboros” e qual o seu significado?
A ideia original de “Ouroboros” surgiu de forma espontânea, enquanto eu tomava um café e escrevia sobre como exibir meu curta-metragem. Naquele momento, nasceu o desejo de compartilhar com o público a jornada que vivi no dia da filmagem, uma metáfora das minhas próprias experiências de vida, para que as pessoas pudessem ouvir o poema e assistir ao vídeo com um novo olhar, mais sensível e profundo.
Inicialmente, o projeto se desenhava como uma meditação guiada. Esse era o formato original. Mas logo percebi que queria levar essa experiência para o teatro, o lugar onde sempre sonhei estar. E se o poema e o curta falam também sobre isso, fez todo sentido que a vivência acontecesse ali.
A partir daí, eu já tinha muito claro o que desejava provocar nas pessoas, o que queria contar e cada etapa dessa jornada. O desafio era entender como transformar tudo isso em uma experiência teatral. Foi então que encontrei a Mylena e a Alexandra, e juntas construímos a dramaturgia de “Ouroboros”. As duas diretoras conseguiram traduzir minhas ideias e sensações em linguagem cênica, dando forma ao que hoje é uma performance cênica, sensorial e interativa.
“Ouroboros” é o retrato de uma jornada de redescoberta, um convite à reconexão com o sentir, o corpo, as escolhas, a autonomia e, principalmente, com a espiritualidade. Um convite ao despertar em uma sociedade tão dormente.
Falando em simbolismos, “Ouroboros” tem uma imagem de uma serpente (ou dragão) que morde o próprio rabo, representando os ciclos de morte e do renascimento (fim e início). Como isso aparece na performance?
O simbolismo do Ouroboros atravessa toda a performance, a começar pelo arquétipo da cobra, presente no figurino, na dramaturgia, nos sons e nas projeções. O espetáculo é uma jornada sobre morrer e renascer, sobre as transformações que vivemos através do prazer, da dor, do medo, da fé, da luz e da sombra.
O trabalho corporal é essencial para essa narrativa. A repetição dos movimentos e das músicas em diferentes formas revela o ciclo contínuo da vida, a constante renovação de quem somos. O figurino simboliza a troca de pele, o crescimento e a libertação do que já não serve, enquanto a dramaturgia se estrutura em camadas de construção, quebra e reconstrução.
O arquétipo da serpente também representa a força feminina, que é o ponto central deste trabalho. Ele se conecta ao poder da criação, ao sagrado feminino, ao sensível e às deusas de tantas culturas. São nomes esquecidos, distorcidos e negligenciados, que precisamos revisitar. Sou devota de Ísis e de tantas outras representações dessa energia que tudo abraça. É a força do todo, que acolhe os mistérios e nos recorda da responsabilidade que temos por nós e por tudo o que existe.
“Ouroboros” é um trabalho seu multiformato. Começou como um poema, virou um curta-metragem e agora se tornou um espetáculo teatral. O que a experiência presencial do teatro traz para esse trabalho e o que o público pode esperar?
O teatro traz um espaço de presença absoluta, onde não há distrações, apenas o encontro com o sentir e o refletir. Por ser uma performance interativa, esse convite é vivido de forma ativa, em que o público se torna parte da experiência. É uma oportunidade de pausa, de escuta profunda do próprio corpo e das mensagens que ele quer revelar. O público pode esperar um momento de reconexão consigo mesmo, de cura, de reflexão e também de prazer.
Como foi a troca criativa com Alexandra Azambuja na direção e Mylena Carreiro na preparação corporal? O que cada colaborador trouxe de essencial para que “Ouroboros”?
Foi mágico. Tem sido um processo lindo, um verdadeiro encontro. Alexandra e Mylena foram extremamente sensíveis e conseguiram extrair o melhor de mim para esta performance. Fiquei muito feliz quando aceitaram embarcar nesse projeto, porque ambas compreenderam profundamente meus desejos e ideias, traduzindo-os para a linguagem teatral e cênica. Juntas, construímos a dramaturgia e costuramos essa narrativa.
A Alexandra me acompanha desde a coprodução e codireção do curta até a direção da performance. Ela conhece o meu percurso de reencontro com a minha artista e tem colaborado ativamente para o meu desenvolvimento. Trouxe as provocações que eu precisava e uma linguagem rica e poética, que ampliou as camadas simbólicas da obra.
Já a Mylena, com a direção de movimento e a preparação corporal, foi essencial, porque “Ouroboros” é, acima de tudo, corpo. A performance conta sua história por meio do corpo, em diálogo com um monólogo. Foram meses de pesquisa conjunta para entender como atravessar os sentidos e cada etapa do roteiro através do movimento. Mylena me trouxe referência, estudo, reflexão, experimentação, presença e descobertas sobre como poderíamos trabalhar e expressar essa narrativa por meio do meu corpo e de suas possibilidades.
Como está sendo o retorno do público da temporada de “Ouroboros” no Teatro Candido Mendes?
Tem sido uma experiência incrível. É muito bonito, como artista, escutar sobre o meu trabalho a partir do olhar do outro. O que mais me toca é perceber como cada pessoa desperta para algo diferente. Algumas falam sobre a importância de voltar a experimentar, saborear, sentir o corpo com presença. Outras sobre o quanto a performance provocou reflexões sobre prazer, natureza, e a forma como habitamos o mundo.
Ouvi relatos como “surpreendente, superou expectativas”, “provocador, relaxante e potente”, “intenso, visceral e poético”. Teve quem disse: “senti tudo, muitos sentimentos, estou absorvendo e processando essa experiência” e também quem definiu como “uma viagem guiada pelos sentidos, atravessando o prazer, a dor e a transformação, só indo pra saber”.
Essas trocas me mostram que o propósito da obra está vivo. Ouroboros é um convite à reflexão, ao sentir, à cura e à lembrança do espaço que somos e habitamos.
Acompanhe o Instagram do espetáculo: @ouroboros_performance
SERVIÇO
OURUBOROS
Com Rafa Machado
📍 Local: Teatro Candido Mendes – Sala 01, Ipanema
📅 Datas: Todas as terças de outubro, às 20h
⏱ Duração: 60 minutos
🔞 Classificação indicativa: 18 anos
🎟 Ingressos: R$33 (meia) e R$66 (inteira), disponíveis na Sympla ou na bilheteria do teatro.
https://bileto.sympla.com.br/event/109145/d/331928







