O suicídio, por muito tempo envolto em silêncio e tabu, hoje ocupa espaço necessário nas agendas de saúde pública e nos debates sociais. A criação do Setembro Amarelo e a realização do Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, em 10 de setembro, simbolizam avanços importantes. No entanto, é urgente reconhecer: falar sobre o tema apenas um mês por ano não é suficiente.
Os números mais recentes expõem uma realidade alarmante. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o suicídio é a quarta principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos no mundo. No Brasil, dados do Ministério da Saúde mostram que, entre adolescentes de 15 a 19 anos, já ocupa a terceira posição. Ainda mais preocupante é o crescimento dos registros: estudo da Fiocruz Bahia revela que, entre 2011 e 2022, a taxa de suicídios entre 10 e 24 anos aumentou 6,14% ao ano, superando a média da população geral.
Esses números não podem ser tratados como estatísticas frias. Eles apontam para o sofrimento silencioso de milhares de jovens que, em meio a transtornos mentais, como depressão, transtorno bipolar ou dependência química, veem na morte uma saída para a dor. Mais de 90% dos casos de suicídio estão ligados a essas condições. E, ainda assim, o preconceito em relação ao tratamento psicológico e psiquiátrico segue sendo um obstáculo.
A prevenção precisa ser encarada como responsabilidade compartilhada. A família desempenha papel central: ouvir, observar mudanças de comportamento, respeitar sentimentos e manter o diálogo aberto pode salvar vidas. Pequenos sinais, como isolamento, perda de interesse por atividades cotidianas ou desânimo persistente, devem ser levados a sério. Não se trata de exagero, mas de cuidado.
Por outro lado, não se pode depositar todo o peso dessa tarefa nas famílias. É dever do Estado ampliar políticas públicas consistentes, que garantam acesso a atendimento multidisciplinar, campanhas permanentes de conscientização e fortalecimento da rede de saúde mental. O tabu em torno do suicídio só será superado quando o acesso ao cuidado se tornar tão natural quanto a busca por qualquer outro tratamento médico.
Pedir ajuda só será possível se a sociedade, em conjunto, oferecer acolhimento, informação e tratamento sem preconceitos. O suicídio não é uma escolha pela morte, mas um grito desesperado contra a dor. Prevenir o suicídio exige mais do que campanhas pontuais: exige um compromisso contínuo, ético e humano. Porque cada vida preservada é, em si, uma vitória coletiva.
Andreia Calçada é psicóloga clínica e jurídica.